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TJES decide que Política de Qualidade do Ar de Vitória é constitucional

Por Lucas Schuina / SÉCULO DIÁRIO / Foto: TJES

Suspensa em caráter liminar desde 2023, a Política de Qualidade do Ar de Vitória (Lei 10.011/2023) entrará novamente em vigor. O Tribunal de Justiça do Estado (TJES) concluiu o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pela Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes) contra a norma, e contrariou as argumentações da entidade patronal. Apenas um pequeno trecho da lei foi considerado inconstitucional.

O julgamento foi iniciado abril, mas teve cinco pedidos de vista, o que prolongou a análise da questão. Todos os desembargadores acataram o posicionamento do relator, Fábio Brasil Nery, incluindo Fernando Zardini, que concedeu a liminar reivindicada pela Findes em 2023 – ele mudou de posição após o voto do relator.

De acordo com Fábio Brasil, os municípios possuem, sim, competência suplementar para legislar sobre meio ambiente para atender assuntos de interesse local, conforme apontado em dispositivos das constituições Federal e do Espírito Santo. Decisões mais recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) também referendam esse ponto de vista.

Em seu voto, o relator destacou as peculiaridades de Vitória apontadas pela defesa da Câmara de Vereadores: uma ilha e Capital de um estado – só existem três em todo país -, onde está contido um porto, um aeroporto e um complexo industrial de grande magnitude – da Vale e ArcelorMittal – inserido bem no coração da cidade, entre bairros populosos e uma praia de grande circulação popular e turística.

O desembargador ressaltou, ainda, notícias recentes sobre aumento do “pó preto” na cidade e argumentou que o próprio STF obrigou o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) a adotar padrões de qualidade do ar compatíveis com entendimentos científicos mais recentes da Organização Mundial de Saúde (OMS).

“Dentro deste cenário, verifico que o município de Vitória, ao normatizar padrões mais rigorosos de qualidade do ar, atendendo suas peculiaridades locais, caminha ao encontro da recomendação da OMS, colocando-se em posição de vanguarda no aprimoramento do controle e prevenção da poluição atmosférica em âmbito municipal, não havendo se falar em rota de colisão com as disposições contidas no Decreto nº 3463-R/2013 e nas Resoluções Conama nºs 491/2018 e 506/2024, tampouco com a Lei Estadual 12.059/2024, mencionada pela parte autora [Findes]”, afirmou.

O relator rechaçou, ainda, a argumentação da Findes de que a Câmara de Vereadores invadiu a competência do Poder Executivo ao editar norma que cria despesas para a administração municipal. Fábio Brasil apontou que a invasão de competência ocorreria somente se houvesse modificação estrutural da gestão, acrescentando ainda que a própria lei estabelece que a prefeitura deverá regulamentá-la por decreto.

“Lado outro, a norma em nada altera a estrutura ou atribuições já existentes dos órgãos da Administração Municipal, tendo apenas demandado a atuação quanto ao controle e monitoramento da qualidade do ar, encargo este inerente ao Poder Público, a fim de concretizar o direito social à saúde, previsto na Constituição, através de melhores índices de qualidade do ar. Logo, não há que se falar em desrespeito à iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo”, escreveu.

O relator opinou pela inconstitucionalidade de apenas um trecho de um dos dispositivos do artigo 3º, que estabelece prazo de um ano para que a gestão apresente ao Conselho de Defesa do Meio Ambiente de Vitória (Condema) uma proposta de resolução que estabelecerá limites de emissão de poluentes atmosféricos para fontes fixas presentes no município. Fábio Brasil Nery votou para suprimir apenas a parte que determina o prazo.

Luta pela qualidade do ar

Lei nº 10.011 foi sancionada pelo prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) no dia 19 de dezembro de 2023, a partir de uma emenda substitutiva ao Projeto de Lei nº 54/2023, proposto pelo ex-vereador André Moreira (Psol) em março daquele ano, que foi aprovada por ampla maioria pela Câmara de Vereadores no dia 5 de dezembro.

A ADI foi protocolada dois dias depois da sanção, em 21 de dezembro, e o desembargador Fernando Zardini acatou-a liminarmente menos de quatro horas após o protocolo, durante um plantão judiciário, alegando risco de prejuízos financeiros para as empresas instaladas na Capital.

No ano passado, o Ministério Público do Estado (MPES) se manifestou contrariamente à constitucionalidade da lei, fazendo coro à Findes. Na visão do MPES, o município não tem competência para legislar sobre essa matéria, apenas os entes estadual e federal.

Na ocasião, André Moreira afirmou que “essa posição é muito antiquada, muito atrasada do ponto de vista do constitucionalismo. Sempre há possibilidade de legislação local e, em matéria de direito ambiental e direito à saúde, o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou decisões indicando que o município pode contrariar legislação federal e estadual se for mais protetivo, que é o nosso caso”.

“É necessário, é urgente, que a gente adote uma medida, uma legislação, cujo rigor seja adequado à preservação da saúde dos moradores de Vitória. E Vitória tem uma siderúrgica dentro da cidade e outra na beira da cidade. Não dá para adotar o padrão estadual em Vitória, justamente porque Vitória tem uma peculiaridade, que é a presença dessas duas grandes empresas, além de outras, porque, obviamente, a legislação não é só referente a elas”, defendeu André Moreira, em sustentação oral durante o julgamento.

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