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Comunidade pede participação em projeto de concessão de parque

Por Mariah Friedrich / Século Diário / Foto: Gleyson Tete

As manifestações dos moradores destacaram a importância da área de proteção ambiental para a sobrevivência da população local e reforçaram o apelo por uma gestão popular que respeite a função primordial da Unidade de Conservação (UC). O parque chega a receber 100 mil pessoas anualmente, e as comunidades tradicionais dependem dele para manter seus modos de vida, como destacou a liderança quilombola Gessi Cassiano, representante da comunidade de Linharinho, localizada nas proximidades da UC.

“O que está sendo discutido é a sobrevivência”, definiu. Ela ressalta que a população não tem conhecimento da dimensão dos impactos do modelo de exploração turística, que vai beneficiar grandes empresas. “Pode gerar emprego e renda agora para algumas pessoas, mas o impacto para nós, dentro das comunidades, pode ser muito maior a longo prazo”, afirmou.

Com faixas e cartazes, o público presente demonstrou posições contrárias e favoráveis ao programa, mas se uniu em torno do consenso de que a comunidade precisa estar no centro das decisões. Outro ponto de concordância entre os participantes da audiência está na reivindicação por mais investimento do setor público e a corresponsabilidade da comunidade na preservação da área, relata Adelson Barbosa, do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), residente do Assentamento Valdicio Barbosa, localizado no entorno da vila.

“Todos questionam o descaso do Estado e reconhecem o papel das pessoas que vivem e trabalham ali, porque é cuidando do parque que se cria as condições para a permanência das atividades econômicas”, observou.

A sensibilidade ambiental do Parque Estadual de Itaúnas é uma das principais preocupações, pois a área sofre com processos de degradação desde a década de 1970, quando a vila original foi soterrada pelas dunas. Adelson argumenta que a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Seama) deveria ter convocado a audiência pública sobre o programa de privatização para garantir a deliberação popular. No entanto, o debate só foi realizado por iniciativa da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia, sob a liderança da deputada Iriny Lopes (PT).

Apesar da privatização ter sido apresentada como instrumento de desenvolvimento econômico pelos representantes da Seama, Iriny questionou se essa perspectiva chegaria à coletividade. Ela destaca que o plano de negócios voltado para o turismo de massa compromete a função primordial dos parques estaduais, a conservação ecológica, além de descumprir a legislação e violar os direitos da comunidade. “A convivência do parque com o desenvolvimento econômico tem que ser harmônica, porém, não há harmonia com grandes empreendimentos. Não deu certo em lugar nenhum do mundo”, alertou.

‘Precarizar para vender’

A vulnerabilidade do Parque de Itaúnas, ressalta a deputada Camila Valadão (Psol), é consequência direta do desmonte dos mecanismos de conservação ambiental promovido pela governo do Estado, agravado pela flexibilização das leis ambientais e pela redução de investimentos em órgãos de fiscalização como o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) promovidas pela gestão do secretário de Estado de Meio Ambiente, Felipe Rigoni.

Para ela, o sucateamento das unidades de conservação atende a uma estratégia que visa “precarizar para vender” e reforçar uma justificativa para a privatização. “É grave a situação das unidades de conservação. Não vamos aceitar a entrega do nosso patrimônio ecológico para o lucro da iniciativa privada”, declarou. Segundo a deputada, outras audiências públicas serão marcadas para que o tema continue a ser discutido.

Diante das críticas ao projeto apresentado na mídia, o assessor do secretário, Vitor Ricciardi, mencionou durante a audiência que a Secretaria de Meio Ambiente realizará audiências públicas em dezembro deste ano e instalará um escritório na comunidade. No entanto, o prazo de entrega do plano de negócios desenvolvido pela consultora Ernst & Young se encerra em janeiro, o que limita a deliberação dos moradores.

Na última semana, o coordenador do programa se antecipou à reunião da comissão e foi até vila, onde se encontrou com empresários, comerciantes e membros da equipe do parque. Durante sua estadia, moradores relataram que o representante do governo declarou que “a visita era informal” e não fazia parte da agenda oficial do governo.

Impactos socioambientais

Os projetos iniciais de empreendimentos turísticos para o Parque Estadual de Itaúnas, em Conceição da Barra, e o Parque Estadual Paulo César Vinha, em Guarapari, apresentados pela consultora Ernst & Young, contratada sem licitação por 8 milhões, incluem estruturas de grande impacto em áreas naturais protegidas. Propostas como teleféricos, tirolesas, restaurantes, hospedagens e estacionamento para centenas de veículos são consideradas por especialistas como incompatíveis com o status de proteção integral dessas áreas.

Em Itaúnas, o plano de intervenção é dividido em cinco polos. O primeiro, próximo ao Hotel Barramar, terá duas pousadas de 15 quartos, um restaurante e estacionamento para 200 veículos. O segundo reúne intervenções na antiga foz do Rio Itaúnas, onde serão replicadas as estruturas e conectadas por trilhas suspensas. A sede do parque será reformulada com escritórios, alojamento para 16 pessoas e um centro de visitantes, além de um memorial sobre a vila soterrada, cafés e lojas, e uma tirolesa. Além desses, o projeto prevê transformações no Polo da Trilha dos Pescadores e na Praia do Riacho Doce.

No Parque Estadual Paulo César Vinha, as intervenções se dividem em dois núcleos. O primeiro, perto da portaria principal, Lagoa de Caraís e Mirante do Alagado, incluirá teleféricos, uma torre de tirolesa e trilhas suspensas. O segundo, que cobre o acesso secundário, abrangerá a Lagoa Feia e áreas alagadas, com a instalação de 28 glampings e bangalôs, decks flutuantes, uma piscina e um restaurante.

Além das unidades de Itaúnas e Guarapari, o Peduc engloba outros quatro parques estaduais: Cachoeira da Fumaça (PECF), em Alegre, e Forno Grande (PEFG) e Mata das Flores (PEMF), em Castelo, no sul do Estado; e Pedra Azul (Pepaz), em Domingos Martins, na região serrana.

Comunidade pede participação em projeto de concessão de parque

Fonte MP ES